sexta-feira, 13 de março de 2020

segunda-feira, 2 de julho de 2018

domingo, 4 de março de 2018

Agraperecer

Sou são sem ser santo,
e grão sem ser mestre,
e ar e fogo e pó terrestre,
e vento campestre,
que pelo tempo passa

Se vejo na flor e na abelha a Graça,
é porque em mim Ela fez morada,
e se agradeço ao tempo no qual pereço,

é porque mereço estar na Jornada.

sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

terra

às favas com as ideias e o bom gosto
para o teu tio diabo com a métrica
desintegra a moral
estupra a moda e o que o outro pensa
porque maldito seja o ego e o brio
esmaga a sobra e o acúmulo
e volta
pelo amor do deus pardo de teu intestino
volta reto e venal pronde habita teu ser
onde não tem espaço pra medo
onde teu falso eu não aguenta estar
e lá trepa com teu deus
porque não és o que pensas ser
porque tudo é e sempre foi sobre sentir
sobre sentir pela planta dos pés a terra
o poder e o amor da mãe que te cerca
e pelo topo da tua cabeça a lua
e pela tua pele o calor do pai sol
porque maldito,
é e sempre foi sobre respirar
e mais nada.
trepa com o desconforto
da areia fina entre teus dedos
e entende a doença que tua carne ensina
pra merecer a saúde que teu divino exala
porque aqui é sobre existência
sobre essa dama-puta gostosa:
teu sentir
é sobre estar com a terra,
com a lua, com o sol
com tuas vísceras fedorentas
que te fazem terra
vai e abraça tua luz
mas não abandona tua carne
não abandona tua terra
porque é assim que a alma voa
só depois de saber o que é terra
tua alma pode saber o que é ar
e ir livre como balão que o vento guia.

sábado, 16 de setembro de 2017

Sermen

do pó para o barro, do barro para o nada. sêmen vindo do escroto, vira larva parida do útero, e ganha o mundo: tudo o que foi, vontade e desejo, cegueira e visão, e tempo mal gasto, e tudo que julgou ser, pai ou mãe ou filho, operário ou banqueiro, morre com o tecido, agora carne podre, sem ter sido.

segunda-feira, 31 de julho de 2017

Decadecência

Queria que tivessem a decência de me dizer por que mentiram. Queria que contassem porque disseram um dia que éramos a imagem e semelhança do Criador, e que por isso meus irmãos de Plano deveriam servir à mim. Pelo que me contaram, e pelo conforto da ilusão que comprei, por querer, usei da lã das ovelhas e da pele dos ursos, e comi da carne dos búfalos e cervos, e derrubei a casa dos pássaros e me apropriei dos ovos que seriam seus filhos. Sem agradecer sequer, e sem respeitar a Vontade Sagrada que Se fez Terra e Vida, me servi de tudo o que era Vivo e do que pude e que entendi ser meu por direito, direito único da única criatura verdadeiramente filha do Deus que ela mesma criou.
Dominei toda a criação Dele: Galguei os continentes sobre o lombo dos corcéis, e as águas sob a égide dos ventos; Aprendi os segredos da Terra, do Sol, do Dia e do Tempo. Desde então, cada dia serviu a mim, semideus racional que sou, para meu conforto e conforto de minha prole. Quis dominar a Terra, e a dominei. Quis dominar o tempo, e o dominei. Quis dominar o desejo, e criei a moral, e quis dominar ao outro e esqueci dela. Dominei tudo o que poderia dominar, menos meu medo e minha ganância. Hoje, o que resta do mundo que me amou, eu uso. O que posso extrair, extraio: Das montanhas eu tiro as pedras, e do solo sagrado, os metais. De tudo o que descansa sob a terra, eu roubo energia... e tudo que toco, deturpo, estrago, alieno. Sou a escória Humana, apodrecendo o chão por onde piso: Subjugando, humilhando, cuspindo na Mãe Terra que me amou e me ama, tomando o que julgo ser meu por direito que eu mesmo me outorgo. Não posso ser parado: Se a água está podre até para os peixes, eu a filtro; Se o solo morrer e não restar uma planta sequer, desmatarei solo novo, por soja, por milho, por dinheiro, por bois. Nada pode me parar, porque sou a criatura mais amada por Deus.

sábado, 29 de abril de 2017

Dazideia

Ideologias são como cangas e tapas: Servem bem aos asininos e muares.

terça-feira, 27 de setembro de 2016

Tristranhos

Abraço a tristeza como uma velha amiga que me traz versos. Flertamos, antecipando um coito impuro e incomedido. Trepamos. No fim, ela me abraça, e não me quer deixa ir: Diz que sente minha falta, que tem saudades de meus versos, e que eles eram tão seus, e que tem ciúmes das coisas, segundo ela menos bonitas, que tenho escrito às outras. Ela diz que gostaria de estar nas linhas que tenho escrito, e diz que éramos um, feito carne e unha. Eu a fito, nua, e sorrio. Eu a fito e olho dentro dela com a propriedade de quem a conheceu como poucos. Olho dentro dela apenas por olhar, sem rancor ou saudade. Estamos ali, ocupando o mesmo quarto, mas não mais a mesma alma. Eu a solto e me afasto, e ela se vai, silenciosa. E, enquanto termino esses versos, já somos estranhos.

quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Sangria

Entre o são e o insano,
tons de cinza
acordaram a metrópole.

Minha pressa e teu caos,
gêmeos de um delírio só,
como a luz dos teus olhos,
partiram,
pra ganhar o nada.

Era só um dia comum,
pra ser gasto feito esmola
que a vida cobra.

Na tarde arrastada,
teve o tempo morte alada
e costumeira:
Sem rastros ou sentido.

E o cair da noite
trouxe consigo
um convite e uma dor,
plenos de significado:

Aquele horizonte,
vermelho,
era todo a ausência de ti,
feito uma sangria n'alma.

Castãnoz

No castanho do teu olho,
feito casca de noz,
coube o Universo inteiro
dos meus sonhos.

segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Do Voto

Voto: Canga que o boi usa, de bom grado, por crer ser canga que impõe ao fazendeiro.

segunda-feira, 15 de agosto de 2016

Bastante

Teu amor não bastava,
ao bastardo que então eu era,
mas hoje ele bastaria.

Engraçado como a gente erra,
ao CrerSer quem deveria.

Ezquina

A estupidez sempre espreita
no dobrar de uma esquina
de uma visão estreita.

quarta-feira, 15 de junho de 2016

Coletivos de mim (poema coletivo)

*O poema abaixo foi feito por muitas mãos. As pessoas estavam em um bate-papo, e foram dizendo as frases e juntamos. O tema inicial era "Falta".


Lá fora é lua crescente,
e a tela é só tua ausência,
e se a tela me olha, nem estranho,
não te ver me levar à demência!

Tua falta me arde e me rasga,
essa dor que é saudade, e corrói,
se eu soubesse que amar tanto dói,
gritaria essa dor que me engasga!

Sozinha eu escuto o marulho,
desses nós de dentro mim,
como pôde o dizer do teu nome,
tão amado principiar o meu fim?

Se eu desejo apenas teu riso,
e nesse querer sempre me deparo,
é por ser caro esse amor que preciso,
e aos sete ventos por ti declaro!

Se sigo te querendo, e sou incompleto,
feito uma lástima num dia esquecida,
tenho o direito de fugir do teu tão perto,
pra não me ver num manicômio, enlouquecida!

terça-feira, 14 de junho de 2016

terça-feira, 7 de junho de 2016

Pedro

Pedro [Micro-conto]

Pedro abriu a porta da estante. Dentro dela havia um fim de tarde muito bonito, e um gramado viçoso, onde corriam crianças com seus cães, brincando de pegar. Havia algumas pessoas sentadas sobre toalhas coloridas, lanchando. Todas aquelas pessoas verde-limão pareciam muito felizes. Pedro fechou a porta da estante, preocupado e pensativo: O que haveria na gaveta?

Pedro parou um instante: Não sabia se deveria abri-la ou não. A gaveta era menor, então talvez não comportasse uma tarde inteira... Será que haveria na gaveta as mesmas pessoas verde-limão? Será que também haveria nela crianças e cães? E se saíssem da gaveta exércitos de criaturas estranhas e desconhecidas? E se essas criaturas tomassem sua casa e sua rua, ou quem sabe, o mundo? Acalmou sua mente e seu coração, e pôs a mão direita sobre o puxador... sentiu a coragem crescendo dentro de si, sentiu-se bravo como um leão – "mas leões não são bravos..." – pensou – "leões são covardes... a gaveta” – suor sobre a testa, olhar fixo, o peso do mundo nos ombros... vagarosamente abriu a gaveta, como se abrisse a caixa de Pandora:

– “Por Deus! São duas colheres!”

terça-feira, 24 de maio de 2016

Lótus

Da lama, vem o dilema,
drama, então seiva bruta,
subindo pelo xilema,
pra ter na folha a labuta.

Glicose a folha comuta,
de água, carbono e luz,
floêmica seiva produz,
nobre, limpa, impoluta,

que descendo, pelo floema,
conduz a planta à permuta,
pela seiva-saber-poema,
que a alma toca e transmuta!

Quão sábia é a natureza,
resultar de tanto labor,
profunda e bela pureza,
da Lótus, divina flor!

segunda-feira, 23 de maio de 2016

sexta-feira, 29 de abril de 2016

Do que sei do Céu

Como escrever sobre o céu,
se não o conheço?

Do céu entendem os pássaros,
que tem nele um destino e um convite,
liberdade viva,
e um confino, e um limite...

Do céu entendem as estrelas,
que por ele, na noite dançam,
e a lua, que reflete o sol que antes foi dia...

Que hei eu de saber do céu,
se no céu não vivo?

O que sei do céu,
é que dele Deus tirou a cor dos teus olhos,
e desde então, dos teus olhos tem o céu inveja.

segunda-feira, 18 de abril de 2016

domingo, 17 de abril de 2016

Temerárido

Temerário é o uso do erário,
e ao vil expediente, diligente,
e nos contam o conto do vigário,
de servir o erário à gente!

O erário serve ao governante,
e seu uso não tem na decência um crivo:
Seja para a esposa, o filho ou amante,
seja verba desviada ou cartão corporativo,
o erário segue, como cortesã elegante,
que um político pedante conduz, lascivo.

Temerário é o uso do erário,
e ao vil expediente, diligente,
e nos contam o conto do vigário,
de servir o erário à gente!

O erário serve esse sujeito,
pouco honesto, o governante:
Seja em campanha ou n'algum pleito,
no calar funesto de ideia dissonante,
o erário segue servindo ao malfeito,
e ao mau jeito desses vermes eloquentes,
seja em artimanhas ou sanhas golpistas,
ou em atos populistas, improbes e indecentes.

Temerário é uso do erário,
e ao vil expediente, diligente,
e nos contam o conto do vigário,
de servir o erário à gente!

sexta-feira, 8 de abril de 2016

Subnominando

A cena diz mais de mim
e de tu, que dá cena.
No truque que encena,
no homem cruzando o beco,
eu vejo um ladrão,
o sindicalista um peão,
e o mendigo, pirão.
Pra cena, beco no homem,
todo mundo é ator:
O ladrão e o peão,
o mendigo e a fome;
Pra cena, beco do homem,
todo mundo é ator,
sendo ou não dor,
tendo ou não nome;
Na cena-beco, nu o homem,
o homem é o beco,
e o beco é o homem.

quinta-feira, 7 de abril de 2016

CheuVer

Estruturam-se atordoados de átomos,
brotam conglomerados de células,
terrenos onde somos condomínio de ideias.

Será que chove?

Rumanando

É preciso dar nome aos bois:
Marias, Pedros, Joões,
ruminando pelos currais
de suas subjetividades,
em filas de metrô,
nos bretes sujos dos centros,
pisando as dignidades
perdidas pelas parelhas
que por ali passaram,
rumando o abate diário
de quem poderiam ter sido.

quarta-feira, 30 de março de 2016

Da afinidade

Afinidade é ponte ligando almas.

estreitempo

o tempo espreita
sem ser notado,
e se estreita,
ao morrer calado.

Pouco a pouco

Te perderei por desatenção:
Pelo Presente negado,
assim, sutil.

Te perderei nos minutos de atraso,
nessas pequenas escolhas quanto a cor,
perfume ou lugar.

Talvez te perca por escolher a hora errada
de dizer a coisa certa,
ou por escolher a hora certa
de dizer desnecessarisinceridades...

Te perderei assim,
por não notar o que não importa.

Pouco a pouco, sem Querer,
quase que não querendo,
é assim que te perderei:
Pequenas prestações de conta velha
que o tempo cobra,
como obra que um artesão esculpe,
em cada entalhe-detalhe,
despretansiosa e minuciosa-mente.

palavradas

palavras aladas
atadas por cordas,
saem, em hordas,
de dentro de mim,

contando que

palavras lavradas,
presas à terra,
enraízam quem erra,
dentro de mim,

doendo, porque

palavras mentidas,
mentira-esparrela,
chegaram-se dela
e armaram-se em mim,

preu cair, morto.

segunda-feira, 28 de março de 2016

Tequisla

Sal,
pele,
limão,
lábio,
língua.
Te
quis,
lá:
Tequila.

Realiverdades

Observo a folha.

Ela está mais verde que o normal,
ela está mais folha que o normal,
ela está mais verde do que folha.

Observo a mim observando a folha.

Que sou eu e o que é folha?

Seria a folha o verde que a folha pintou em mim,
ou seria a folha o verde que pinto em mim ao ver a folha?

Somos o ver da folha,
e há folhas verdes porque as vejo,
e há um eu porque voz em vós as vedes.

sábado, 19 de março de 2016

Sêila

Que é a vida se não sonho que se vive?
E que é o sonho senão vida que se sonha?
Ser é saber do que se sente,
e sinto que és tão bela quanto a luz permite.

És indesculpavelmente bela, e mais
mais que o verbo alcança e o sentido percebe.
És indecifravelmente bela, e mais
mais que o distinguir o real do sonho permitiria saber.

É tanto que não sinto,
é tanto que não percebo,
é tanto que não distinguo.

Apenas é assim:
Eu apenas Sêila.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

33

Me movo pelo mundo ou o mundo se move por mim?
Passo pelo mundo ou o mundo passa por mim?
Sou parte do mundo ou o mundo é parte de mim?
Sou parte do mundo ou o mundo parte de mim?

São 33 anos,
são 33 vidas,
às vezes mais e noutras menos,
são.

Passo pelo tempo,
E o tempo é o lugar que o espaço ocupa:
O tempo é a forma de não pirar da cuca.

São 33 anos,
são 33 vidas,
às vezes mais e noutras menos,
louco.

Passo pelo tempo,
e no tempo me movo e estou contido:
O tempo é o meio em que sou vivido.

Me movo pelo tempo ou o tempo se move por mim?
Passo pelo tempo ou o tempo passa por mim?
Sou parte do tempo ou o tempo é parte de mim?
Sou parte do tempo ou o tempo parte de mim?

São 33 anos,
são 33 vidas,
às vezes mais e noutras menos,
lúcido.

Passo pelo mundo,
E o mundo é o lugar que o tempo acontece:
O mundo é o agora que o processo merece.

Me movo pelo processo ou o processo se move por mim?
Passo pelo processo ou o processo passa por mim?
Sou parte do processo ou o processo é parte de mim?
Sou parte do processo ou o processo parte de mim?

Mundo, tempo, processo,
amor, espaço e divino,
enquanto no tempo não cesso
(e espero que tarde o Destino),
pelo Presente, presente passo,
atento ao que passa pelo cristalino:

São 33 anos,
são 33 perspectividas.

domingo, 14 de fevereiro de 2016

Estando

Sou estar.

Um estar constante e perecível,
e um tanto sensível à lua cheia,
sou coração e alma e processo,
e pele e carne e sangue e veia,
que pelo tempo trilha:
Sou essa ilha, sou essa aldeia,
em meio ao instante gasto,
e não sou puro e nem sou casto,
nem alheio ao pasto e ao ar,
por ser vida e biologia,
levo essa Vontade de arrasto,
bastarda filha do respirar,
se expandindo pelo lastro,
desse escuro e vasto Universo:
Sou de Deus o Verbo e o Verso,
divino réu confesso vagando errante,
uma ilha-aldeia em meio ao instante,
que nem sabe porque existe.

Mas sou feito de amor e éter,
que por ter sido e ser, insiste,
em viver por respirar,
e respirar por aprender.

Sou crença que perpetua no tempo,
por insistir e crer que há razão de perpetuar-se,
nada mais, nada menos:

D'Eus.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

Paragens

Pedi ao vento que trouxesse amor,
e ele fez de mim poesia,
preu buscar o amor noutras paragens,
mas tudo o que via eram tuas imagens,
nessas damas que encontrei pelo caminho,
e minuano frio, segui sozinho,
e minha mente confusa pra mim mentia,
pois se eram as tuas imagens o que eu via,
sentia não amor, mas sim saudade,
falta e dor que só por maldade,
covarde em meu peito se instala e abriga,
me entala e maltrata e minha alma fustiga,
buscar-te nas outras, cidade em cidade.

Carnaval

Que eu seja o coveiro que enterra a decência,
e que eu seja o terno do coveiro,
preto e fúnebre,
e que eu seja o funeral inteiro,
e as mãos enlutadas levando o caixão,
e a tristeza que não veio.

E que eu seja paetê e a pá e a terra,
e me derramem sobre a decência,
para que eu a sinta fria e morta sob mim.

E que eu seja a viúva e que eu não chore,
pois decência alguma merece lágrimas.

E que eu seja livre para a volúpia e a luxúria,
E que eu trepe e sambe sobre o caixão da decência,
E que eu seja meio do mais intenso carnaval,
diabolicamente divino,
divinamente humano e mortal,
quase que candidamente insano.

Dia de Sul

O sol repousa, manso,
sobre o campo verde,
e a garoa fina
perfuma a terra.

O que dizer que não disse o dia?

domingo, 24 de janeiro de 2016

Baú

Pedi à lembrança um sorriso teu,
e ela me fez feliz:
Quis do tempo que parasse neste instante.

Não havia mais o que ver ou sentir:
Teu sorriso basta.

Não há mais mistério que importe,
não há mais Norte a seguir,
nem morte a temer,
pois teu riso, teu riso é a razão de haver,
átomos e ondas, matéria e energia:

Teu riso é cria e razão de ser do Universo.

sábado, 5 de dezembro de 2015

Nada Vale

Sangra, rio.
Sangra cor de cobre,
sangra ferro, sangra bauxita,
sangra tanto que ninguém acredita,
sangra e cobre casa e gente e bicho,
e mato.

Mata, rio,
mata o que vive e o que rasteja,
e a mata, e o que nada, e o que quer que seja,
que esteja no caminho da barragem,
mata a mata e mata a paisagem,
e deixa essa imagem assim,
embarrada, desolada e morta,
vontade torta nesse metal vileza,
tristeza que cavalga o leito,
pelo vil metal, esse deus eleito,
torto deus que nada Vale.

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Do real

O real é a sopa feita de todas as coisas
que ingerimos de alguma forma,
e o real é a Energia que se submete
à Norma de estar no tempo.

O real é essa pintura que fazemos,
dentro e sempre dentro de nós,
e sobre a tela que temos,
e com as cores das quais dispomos,
mal acabada, pobre e torta como somos.

O real é uma mentira que contamos,
para a parte de nós que vê e sente:
Mentira rota sobre o que é o Presente.

quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Efeito

Tanto os pássaros em seus ninhos,
e sua liberdade, agora canto,
como o fluxo desse rio,
adornado pelas sombras dessas árvores,
ausências sentidas da luz desse morno sol,
prisioneira luz dessas folhas verdes,
com as quais a brisa dança,
tanto quanto o destemido fio de luz,
deste mesmo morno sol,
que valente se faz caminho,
pelo ar e por entre as sombras,
para regalar-se à corrente e ao rio...

Todo esse dia, tão pleno e vital,
Todo esse dia, tão verde e morno e vivo,
Todo esse dia grita a quem quer escutar e ver,
o segredo simples do que é ser feliz:
Aceitar e entender e amar o fato maior,
de que para além das coisas que importam e vivem,
há o nada.

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Poeira

Mesmo que escrevas como um poeta,
mesmo que estejas entre poetas,
mesmo que penses como um poeta,
ou mesmo que te acompanhem pelas noites,
o absinto ou o escárnio,
ou mesmo que batam à tua porta,
Insanidade, Angústia ou Solidão,
se não as sentires como um poeta,
se não as sentires queimando em tua pele e comendo de tuas entranhas,
se não as sentires na proporção das dores que tem o mundo,
se não as sentires tiranizando e deglutindo tua alma,
não serás um poeta,
jamais serás um poeta,
e não serão teus versos mais que tempo perdido.

quinta-feira, 17 de setembro de 2015

Alma e pele

O que tens me enamora,
e o que tens me devora,
entranhas, medos e inseguranças,
e o que tens me traz lembranças,
de coisas que não vivi,
e saudades dessas mesmas coisas.

E o que tens é só teu, e eu o admiro,
esse sentir pleno, destemido e vasto,
levando meus medos, de arrasto,
como um vendaval o faria a esses lençóis,
testemunhas que enfeitam meus varais e meus sonhos,
esses lençóis, que quem diria,
tanto viram e sabem, como agora eu o sei,
o quanto a pele pode servir à alma,
e o quanto a alma pode fundir-se à pele...

E eu o soube pelo brilho dos teus olhos,
naquele instante único eu o soube,
e daquele instante o levarei por toda a vida,
esse ensinamento pleno de tua pele-alma-morena,
do que é o sentir verdadeiro,
esse ensinamento agora visceral e encarnado em mim,
esse ensinamento do que é Ser real...

Reencontrei em tua pele e nessa tua loucura,
minha alma e o real e o sentido,
e minha cura.

domingo, 13 de setembro de 2015

Encontro

Não há menos nesses lábios
que se beijam,
do que almas que se tocam.

E povoam meus pensamentos,
cada curva do teu corpo.

E as sinto tão reais,
quanto permitiriam que as sentisse,
minhas mãos e minha língua.

Esse instante em que se tocam,
as almas, pelas bocas,
é tão pleno de sentir e sentido,
como o são vivas as manhãs
em que o sol visita o inverno.

Esse instante em que se tocam,
as vidas, pelas línguas,
é tão mágico e sublime,
como o são mágicos e sublimes,
esses momentos em que se entregam,
as tardes às noites de verão.

Meus lábios e os teus,
como um limiar de almas,
e os teus lábios e os meus,
como um sentido de existência...

Nesse encontro de dois mundos,
tenuemente sobrepostos,
separadamente vívidos e unos,
você e eu,
nesse deus-tempo-espaço-manifesto,
como lábios, línguas e almas.

segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Soneto ao Tédio

Vejo o sol, sem par, tocar a mesa,
E sinto da janela, devir da brisa,
Entorpece-me sentidos, e humaniza,
Meu definhar lento, essa vagareza.

Sou do tempo essa moribunda presa,
que a poeira dos tapetes satiriza,
poeira que ilude o enredo à guisa,
de Farsa sobre minha não-presteza:

Ri-se a poeira desde o chão vadio,
de eu não ser nada senão o fastio,
de eu não ter nada senão ao tédio,

essa mesmice que de mim se apossa,
essa lerdice, lesão que me acossa,
e que tem na morte melhor remédio.

terça-feira, 18 de agosto de 2015

Universo

Somos poema qualquer que o agora diz,
nas cordas vocais do tempo.
Destino ou razão de um deus qualquer
para explodir-se,
razão qualquer que se afasta do centro,
e expande.

Somos parte de um todo que não entendemos,
somos parte de um todo grande demais
para que o entendamos,
e somos filhos da terra que um dia foi cosmo,
e somos o ócio do caos que se estrutura,
por ser energia veloz que desrespeita ao ócio.

Somos filhos da água que um cometa trouxe,
e luz que perde a viagem e aceita um corpo,
pois só assim é livre de ter com o meio.

E temos na chuva e na pele,
e na beleza verde das marés,
e no toque de seda dos ventos de primavera,
razão divina do deus qualquer que somos,
de sermos plenos, gratos, e felizes:
Somos parte viva do poema que o agora diz,

nas linhas curvas do tempo.

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Acrostarquia

Apenas
poetas
enxergariam,
nesta
anarquia
sonolenta,

uma
manipulação
acróstica,

palavras
aladas,
lavrando
avessos
versos,
remando
alíneas,

por
onde
rumam,

linhas
insanas,
notas
humanas
absortas.

domingo, 9 de agosto de 2015

Tarde verde

É tarde verde, sentai e vede, raso e ralo, o regato, levando ao acaso, regalo aos olhos, folha caída, antes árvore e vida, e agora, corrente. É tarde verde, sentai e vede, o Presente. Calai mente e coração, e contemplai e senti, o sabor do acaso, que o tempo regala: Tudo o que foi ponto, explodiu e foi caos, e agora o É, Verde e Belo, Dádiva e Fluxo.

quinta-feira, 2 de julho de 2015

Grude

Eu não sou meu Feicebuqui.
Eu não sou nada maior que um grão de areia.
Eu não sou esse corpo que me carrega,
e eu não sou essa voz, 
não apenas ela, ao menos. 
Eu sou o grão de areia que o universo torna menor que um grão de areia,
e eu sou o grão de areia que o neutrino torna imenso, 
e o ego que me torna falsamente maior que tudo isso.
Eu percebo e digo que penso,
e penso o que digo, e por isso tudo o que eu digo é mentira,
mesmo que eu seja verdadeiro.
Eu sou como um inverno em janeiro, no Sul...
Sou como um céu coberto de nuvens de chuva
num dia de céu azul: Eu não sou.
E tu sou eu.
E eu sou um tu em ti, e tu és um eu em mim.
Decifra-me, Cifra-me, Versa-me e me avessa,
e Seja-me.
Viaje-me por dentro de cada desatino,
e sê eu como tu és tu,
e sê sábio como quem olha para as estrelas e as admira,
e sabe e ama o tamanho que não tem,
pois tudo o disso é divino e belo.

segunda-feira, 29 de junho de 2015

Prepulscia

Pulsa, cidade.
Pulsa como coração fosse,
pois tuas avenidas são tuas artérias,
e tuas ruas tuas veias,
e tuas vielas e becos,
teus capilares.

Pulsa, cidade.
Em teus lares as presas se escondem,
e em tuas esquinas os rumores voam,
nesses bares suburbanos onde bebem,
antes de ter com seus travesseiros sujos,
estes sonhos frustrados,
os mesmos que conduzirás trôpegos,
(pelos teus capilares tão sujos quanto aqueles travesseiros)
para seus quartos pobres de sono leve e barulhento,
teu presente diário ao descanso alheio.

Pulsa, cidade.
Pulsa pois és coração,  mesmo que não ames,
és coração pois há pressa que bate nas pressas,
que se batem pelos caminhos de tuas calçadas
pois há prestações que honrar,
e porque há prestações que honrar,
e porque se esbarram, mais se apressam,
e mais se esbarram.

Pulsa, coração:
No ritmo da pressa do outro e da minha:
Pois esse é o ritmo em que tu pulsas,
e pulsam teus pensamentos e tuas emoções,
que emanam das raivas que transitam pelas artérias,
dessas Medeias que são teu sangue,
e envenenam esse grande e cansado coração,
onde não cabem todos e onde há muitos à margem,
implorando migalhas nas tuas marginais fuligentas.

E tu, maldita, inda pulsas...
Inda pulsas porque há pressa,
essa carapuça que escolhemos para existir sem dor,
essa que é um destino e um meio de vida,
ou de ausência ou anuência dela.

Essa pressa é um pulsar que não pára,
e são esses segundos que o tempo nos rouba nos semáforos,
eles que são essa neurose,
essa psicoescoliose,
essa lordose dosada pelos bancos ruins dos ônibus,
e essa gastrite do almoço ligeiro e do caminhar corrido,
e esse joanete que late para meus sapatos rotos,
(que couberam em minhas prestações, mas não em meus pés)
e esse dolorido do pé, que o fim do dia sempre premia,
com merecida bacia de água quente e lixa áspera.

Arre! Arre que a pressa são essas filas de padaria,
e o tempo que o banco nos toma,
como juros que pagamos pela espera inútil.

Pressa essa que é a morte que espera,
pelos velhinhos das filas preferenciais,
esses pretéritos preteridos pelo grande coração pétro-pulsante,
mas que a morte anseia, e por isso a pressa os prefere.
Sim: A pressa os prefere, como os preferem os bancos,
como preferem suas miseráveis pensões,
e como preferem suas nádegas murchas e colunas arqueadas,
os estofados e os encostos dos bancos dos bancos.

Um dia infatartas, coração.
Um dia infartas, e levas de tudo:
Bancos, velhinhos,
e vielas e filas,
e semáforos e colunas arqueadas.
Um dia infatartas, coração:
Um dia infartas.

segunda-feira, 15 de junho de 2015

Canto do raiar do dia

Acordei nesta manhã,
e ouvi os pássaros cantando.
Senti seu canto dedilhando minh'alma,
como fosse um violão velho e cansado.

Mas a melodia, a melodia deu-me forças:
Como é forte a melodia dos pássaros!
Como são fortes os pássaros,
e como é forte o seu canto.

Invejo o raiar de todas as manhãs,
por acordarem com o canto dos pássaros:
No canto deles têm destas manhãs,
razão de raiarem jovens e mornas.

sexta-feira, 12 de junho de 2015

Aos enamorados

Teus braços,
e os meus:
São laços;

Teus passos,
e os meus:
Compasso;

Teus beijos,
e os meus:
Amasso;

Tua noite,
e a minha:
Cansaço;

Tua vida,
e a minha:
Um paço;

Teu tempo,
e o meu:
Espaço.

quarta-feira, 10 de junho de 2015

Depois

Deixei tudo para depois:
O amor, os invernos, e os verões.
Deixei para depois o instante, a Dádiva,
e fui o depois que não chegou, o postergado.

Fui ter com o fim da vida,
como o faz todo esse gado
que anda e rumina: Fui o precipitado.

E fui o precipício para quem não disseram
que haveria um chão e um fim,
e cheguei.

E tenho hoje, sobre mim,
de terra, sete palmos,
e esses vermes que roem minha carcaça triste,
triste por ter sido como a criança
que no Natal prendeu-se à beleza do pacote:
Triste por ter sido a criança que esqueceu o Presente.

domingo, 7 de junho de 2015

Verdes Verdades

Se é a Verdade
o encontro dos olhos
com o tempo e o espaço,
E se eu pudesse
escolher uma Verdade,
escolheria a Verdade
do verde dos teus olhos
por ser aquela que agrada aos meus.

Do que vivi do amor.

Se estiveres feliz, estarei feliz:
Não deixei de te amar por um segundo.

E te amei mais quando parti.
Parti de ti, e parti teu coração,
mas de mim parti a alma em duas.
E ainda dói.

Dói quando tens raiva de mim,
e eu o sinto, e eu o sei porque
queimam meu estômago,
e entre meus olhos.

Mas essa dor é menor
que a dor de te fazer triste.

Há quem precise voar: Parti e voasses.
Hoje não tenho teu encanto nem teu beijo,
mas vejo teu sorriso e ele é mais belo
que qualquer canto ou beijo poderia ser:
Mais belo que um balão rosa no céu,
e mais belo que o amarelouro do sol.

Quando vejo o verde mar de Maceió,
lembro dos teus olhos e penso
o quanto não devem brilhar
por veres as cores do mundo.

Isso faz de mim Pleno.



(Escrito em 2013 e terminado em 2014. Já não sinto mais isso, mas ficou bonito e achei que deveria publicar.)

Deles

Boêmio abstêmio
Ateu crente
Demente lúcido
Translúcido opaco
Velhaco sério
Mistério aparente
Parente bem-vindo
Dormindo acordado
Fadado escolhido
Afável maldoso
Refrigerante saudável
Besteira importante
Sintonia paralela
Balela verdadeira
Simplicidade complexa
Convexa côncava
Ódio amoroso
Perdão rancoroso
Descanso cansativo
Ativo passivo
Remissivo expandido
Lascivo puritano
Humilde soberbo
Temido adorado
Amado escolhido
Pacífico armado
Específico abrangente
Indigente rico
Onírico real
Lerdo lesto
Oculto manifesto
Político honesto.

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Lero

Morena:

Sê minha Roma
E me chama de Nero
Que eu te incinero.

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

Bonsai


Enxergar as coisas como são,
é a sabedoria de quem observa.
Deixar as coisas como estão,
é a sabedoria de quem entende.
Escolher das coisas como estão,
é a sabedoria de quem vive.
E aceitar as coisas como são,
é da sabedoria de quem ama.

E só quem observa, entende.
E só quem entende, aceita.
E só quem aceita, ama.

E só quem ama, vive.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Dos meus sonhos

Prenderam as ovelhas
que eu contava pra dormir
nas meninas dos teus olhos.

Pois são elas o que vejo
quando cerro os meus...

E o teu abraço roubou de mim
todas as angústias do mundo
e o colorido do arco-íris
tomou conta de minha Vontade...

E já não há cinza em meus sonhos
só o púrpura e amarelo
e um azul que o céu inveja...

O dia

Quero o teu dia perfeito.
Então pedi aos pássaros que cantem
pelos canteiros por onde passares...

Mas os pássaros são livres,
pois apenas livres serão pássaros,
e só assim seriam belos
e dignos do dia que te desejo.

Mas quero o teu dia perfeito.
Então pedi ao sol que encontre a chuva,
e leve arcos-íris por onde ires....

Mas a chuva é livre,
pois apenas livre a chuva semeia vida à terra,
e apenas um dia repleto de vida
é digno de ser o dia que te desejo.

Mas inda quero teu dia perfeito.
Então o aceito como perfeito,
tenha ele ou não
pássaros ou canto ou sol ou chuva.

E então serei livre
e só assim digno
de estar no dia que te desejo.

segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Maya

Maya me leva à praia
e Maya me mostra o mar
E o mar é tão belo e falso
como Maya que o fez vibrar

Meu sentir que sinto ou temo
é o sentir que me faz pulsar
meu sentir é tão falso e pleno
quanto Maya que fez o mar.

segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Brevidades

Seja breve o vento que te traga,
e morno o beijo que te anuncia.
E queime em mim o calor que apaga,
saudade que é chaga, e me angustia.

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

sábado, 13 de setembro de 2014

Ente

Ver antes de ler: https://www.youtube.com/watch?v=pKdJ3LjizpM&nohtml5=False


E Deus é deus
E deus é o cão
e o peixe
e o cão que tentou salvar,
ou enterrar,
o peixe.

E quem riu do cão que tentou
salvar ou enterrar o peixe
E o riso, e o som do riso
que pelo ar chegou ao tímpano
de quem ouviu o riso
que é Deus tanto quanto o tímpano...

E Deus é todo o ar
que o peixe não pode respirar
por não haver água nele...

E a água do chão, insuficiente
também foi Deus e o é agora
na nuvem ou no rio ou no esgoto.

E ele é o filme sobre o peixe morto
que o mistério da vida que não se questiona
tentou reviver
enquanto o mistério da vida que se questiona
filma e ri.

terça-feira, 12 de agosto de 2014